sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

OS CAVALOS DO MEU ENTARDECER



"Só os cavalos são felizes, porque comem a paisagem", disse num verso inesquecível don Atahualpa Yupanqui. Já tive muitos  cavalos e cachorros, até perdi a conta. Na maior parte das vezes,foram sempre companheiros inseparáveis,a cadelinha Fany da minha doce infância,e Indaial,garanhão que não precisou de doma... Tratava a todos com respeito e cuidado, um cavalo é um bicho sagrado, afirmava meu avô Martinelli. Lembro de quase todos, do jeito de cada um, dos mansos, dos caborteiros, dos bons de lida, dos passarinheiros. E dos pelos então, um mais lindo do que o outro. Zainos, , rosilhos, mouros, , bragados ,lobunos, , ruanos, tordilhos, , baios, malacaras, alazões e castanhos. Cavalos são como gente, cada um tem um jeito e é único, é preciso saber lidar com eles. Debaixo do couro, todos eles tem uma alma,sentem dor,sentem fome,sentem frio,tem cumes,tem amor,tem até saudades,igualzinho a gente...

Cavalgo até uma pequena elevação e  consigo ver ao longe uma campina verdejante, , uma mancha escura que parece ser uma aguada. Então recordo do tempo em que vivia no lombo do cavalo, de sol a sol, às vezes sob a Lua prateada em longas cavalgadas até os bailes de barracanas fazendas vizinhas. Na época,e com a juventude aflorada talvez não pudesse avaliar como era boa a vida. Mas vem a escola,a namorada a faculdade o trabalho ,fiquei bom tempo longe do campo,arranchado só  na selva de pedra. Muito tempo se passou sem sentir uma sela sob minhas pernas. Troquei as rédeas pelo volante. A campina virou concreto; a imensidão de grama e capões virou um amontoado de tijolos. Meus sonhos rodaram cedo nessa empreitada, sempre desejei voltar no tempo, até porque não tinha mais terra para criar e cavalgar. As coisas vão acontecendo, os amigos vão morrendo e nada mais pode ser reconstruído do jeito e da forma que já vivemos.

Da aurora da minha vida trago as mais doces lembranças e uma saudade que não sei esconder. Não é fácil confessar que, passados tantos anos, preferia ter ficado lá de onde eu vim, na fazenda Bananal em São Carlos do Pinhal, bebendo água nos riachos, correndo atrás de bezerros, comendo pão quente de forno, pescando lambaris no regato, caçando lebres e preás, galopando em pelo por dias e noites nas pastagens verdejantes. Lá, eu tinha poucos amigos, mas via naqueles  caipiras com muito orgulho  muito mais sinceridade do que nos milhares de olhos que me olham por essas bandas. Mas de tudo, o que mais sinto falta é dos cavalos. Pelo atavismo da raça, um caipira como eu não pode viver sem a companhia de um cachorro e muito menos de um cavalo ,porisso ainda tenho vários.
Hoje maduro, pressinto todos os cavalos do meu entardecer. Uma tropilha celeste virá me buscar. Voltarei com certeza no  galope  de um alazão para o berço eterno do velho Pai.

Nenhum comentário:

Postar um comentário